Indiciado pela Polícia Civil de São Paulo, pelas supostas práticas de associação criminosa, furto qualificado e lavagem de dinheiro no caso VaideBet, o presidente do Corinthians, Augusto Melo, concedeu entrevista coletiva no Centro de Treinamento do clube, na tarde desta sexta-feira (23).
Acompanhado do advogado Ricardo Cury, o dirigente alegou ser inocente e disse estar tranquilo em relação às investigações envolvendo o contrato com a casa de apostas, firmado no início do ano passado, logo após sua posse no cargo.
Melo disse ter recebido a notícia do indiciamento com surpresa e indignação e afastou qualquer possibilidade de renunciar ao mandato. Para a próxima semana, está agendada uma reunião do Conselho Deliberativo do Corinthians, que analisará o pedido de abertura do processo de impeachment contra Melo.
O presidente fez uma fala curta e passou a palavra para seu advogado, que se alongou um pouco mais no pronunciamento, mas não tanto, pois a intenção, segundo eles, era dar tempo para que os profissionais de comunicação presentes à coletiva pudessem fazer suas perguntas, durante o período estipulado de uma hora.
Cury disse estar surpreso com o fato de o relatório da investigação haver sido divulgado nesta quinta-feira (22), às vésperas da reunião que debaterá o pedido de impeachment contra Melo.
Ele também questionou o fato de o documento não se aprofundar sobre os papéis desempenhados por personagens surgidos no decorrer da investigação.
O advogado chegou a citar nominalmente a UJ Football Talent e queixou-se pelo fato de ela não ter sido, segundo ele, ouvida pelo delegado. A empresa foi mencionada em um vazamento à imprensa ocorrido na semana passada, como sendo elo final de um esquema envolvendo o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Procurada na época pela Máquina do Esporte, a UJ repudiou as suspeitas e disse não ter vínculo com as denúncias ou personagens citados pela mídia.
Cury ainda defendeu a inocência de Melo no caso. “A ‘Lei da Ficha Limpa’ não prevê inelegibilidade por indiciamento, mas só em casos que transitaram em julgado. Não há nada contra o presidente. Não há uma prova sequer”, disse.
Crise complexa
Por mais de uma vez, Melo garantiu estar tranquilo com a apuração e mostrou-se disposto a lutar pelo cargo para o qual foi eleito.
“Tenho uma vida honesta. Renunciar não passa pela minha cabeça, em hipótese alguma”, declarou o cartola.
Ele ainda defendeu o acordo firmado com a VaideBet. “Foi um grande contrato. Isso vai ficar provado com o tempo”, afirmou.
Por mais convicto que Melo possa estar ao fazer tais declarações, a realidade é que, na prática, ele apenas prolonga a agonia de sua gestão, que definha em meio a uma crise não apenas jurídica, mas, acima de tudo, política.
A denúncia contra o dirigente tem a ver com o dinheiro pago pelo Corinthians à Rede Social Media Design Ltda., empresa pertencente a Alex Fernando André, mais conhecido como Alex Cassundé, que teria sido o intermediário da negociação entre o clube e a VaideBet.
Na coletiva, Melo tentou se justificar, alegando que só veio a saber mais tarde sobre a existência da intermediação feita por Cassundé.
A intermediação desse contrato garantiu à Rede Social Media Design Ltda. o equivalente a 7% dos R$ 370 milhões que a VaideBet pagaria ao Corinthians ao longo de três anos.
O inquérito policial constatou que parte expressiva dos pagamentos iniciais feitos à Rede Social Media Design Ltda. teriam sido repassados a uma empresa considerada “laranja”.
O contrato com a VaideBet acabou sendo rompido em meados do ano passado, na medida em que se converteu em um escândalo difícil de ser contornado.
Sem base política
Antes mesmo de ser indiciado pela Polícia Civil, Melo já estava sem sustentação política. Na semana passada, a Gaviões da Fiel, maior torcida organizada do clube, anunciou que já não se opunha ao eventual impeachment de Melo.
O apoio da Gaviões representava o último grande trunfo para o dirigente corintiano seguir no cargo.
Para se eleger no fim de 2023, Melo precisou fazer uma grande articulação, costurada pelo conselheiro Rubens Gomes, mais conhecido como Rubão, que acabaria sendo nomeado diretor de futebol do Corinthians.
Em fevereiro de 2024, Romeu Tuma Júnior foi eleito presidente do Conselho Deliberativo do clube. Inicialmente, o resultado foi visto como uma vitória para o grupo de Melo.
Mal imaginava ele, porém, que ali começaria sua derrocada. Não demorou muito e Rubão entrou em rota de colisão com Tuma Júnior, chegando a se referir ao Conselho Deliberativo, em entrevista, como sendo uma espécie de “governo paralelo”.
Em meio a essa disputa de poder, Melo acabou por romper com seu antigo aliado, na esperança de garantir o apoio incondicional de Tuma Júnior. Com isso, isolou-se politicamente, de uma maneira quase fatal.
Em 20 de janeiro deste ano, o órgão presidido por Tuma Júnior realizou uma reunião para votar a abertura de um processo de impeachment contra Melo, por conta do caso VaideBet, mas o encontro precisou ser suspenso, sob a alegação de falta de segurança.
À época (quando o presidente ainda desfrutava de boa popularidade junto aos torcedores), 114 conselheiros (em um universo de 126) se posicionaram a favor da admissibilidade do processo de destituição de Melo.
Como funciona o processo de impeachment
A próxima reunião do Conselho Deliberativo que irá analisar o pedido de destituição de Augusto Melo no Corinthians está agendada para ocorrer na segunda-feira (26), às 18h (horário de Brasília), no Parque São Jorge, em São Paulo (SP).
Se o impeachment for aprovado, o primeiro vice-presidente do Corinthians, Omar Stabile, é quem assumirá o cargo, de maneira temporária .
O Conselho Deliberativo precisará também definir a data para a realização de uma Assembleia Geral, na qual todos os sócios corintianos irão decidir se cassam ou mantêm o mandato presidencial de Melo.
Gaviões pede saída de Melo
Na tarde desta sexta-feira, a Gaviões da Fiel publicou nas redes sociais uma nota solicitando o afastamento imediato de Melo da presidência do clube.
Na visão da organizada, a medida seria necessária “para preservar a imagem do Corinthians”. Melo chegou a ser questionado a respeito do posicionamento da Gaviões, afirmando que torcedores estariam sendo influenciados pela suposta abordagem distorcida do caso feita pela mídia.
Confira a íntegra da nota oficial da Gaviões da Fiel:
“PEDIDO DE AFASTAMENTO DO PRESIDENTE AUGUSTO MELO
Diante das recentes notícias que envolvem o indiciamento do presidente do Sport Club Corinthians Paulista, Augusto Melo, em inquérito policial, o Gaviões da Fiel Torcida vem, de forma clara e objetiva, solicitar seu afastamento imediato do cargo.
Tal medida se faz necessária para preservar a imagem do Corinthians, que deve estar sempre acima de qualquer interesse pessoal, e evitar que os problemas que hoje recaem sobre o presidente impactem ainda mais o clube, que já enfrenta uma grave crise administrativa, financeira e institucional.
O Corinthians é maior que qualquer dirigente. Nenhum cargo, nenhuma pessoa, está acima da nossa história, da nossa tradição e do amor de milhões de corinthianos espalhados pelo mundo.
Reforçamos nosso compromisso de fiscalizar, cobrar e defender os interesses do Sport Club Corinthians Paulista, como sempre fizemos nos nossos mais de 55 anos de história.
Nossa luta e contribuição continuará para a quitação da arena e alteração do estatuto, para proporcionar maiores receitas e mecanismos de administração, que não permitam ocorrer situações que nos levaram ao precário estágio que nos encontramos, independente de quem estiver à frente do SCCP.
Pelo Corinthians, com muito amor, até o fim!
GAVIÕES DA FIEL TORCIDA“
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